Bets, influencers e golpistas enganam na era do ‘rent-seeking’

Em teoria econômica, existe um conceito muito bem consolidado chamado “rent-seeking” que foi introduzido inicialmente por Gordon Tullock e Anne Krueger.

É uma falha de mercado onde um agente econômico influencia ou manipula o ambiente regulatório ou político para aumentar sua renda sem engajar em atividades produtivas que gerem riqueza para a sociedade.

As consequências são extremamente negativas para a economia, gerando ineficiências de mercado, sentimento de injustiça e erodindo a confiança em instituições.

As casas de apostas (ou “bets”) estão nos holofotes desse problema, mas existe todo um submundo nas redes sociais que se materializa na comunidade online de “renda extra”. É uma estrutura complexa que vai desde o mercado de apostas, cursos de influenciadores, investimentos duvidosos e até “bicos online” como clicar em links ou avaliar produtos em troca de remuneração.

Isso virou o grande novo problema para o governo federal e a pasta de Fernando Haddad, que se preocupa hoje com o mercado de apostas. O problema de “rent-seeking” dos cassinos digitais se escancara com o lobby da indústria de aposta junto ao fato de que essas empresas se aproveitam de políticas como o Bolsa Família para aumentar sua receita.

Como mostra a reportagem da Folha, apenas no mês de agosto, brasileiros transferiram R$ 21,1 bilhões às casas de apostas, sendo R$ 3 bilhões de beneficiários do Bolsa Família, o que representa 20% do valor repassado.

É alarmante ver que uma política planejada para ajudar as famílias em situação econômica vulnerável se tornou uma forma de transferir renda para grupos econômicos e também agrava problemas sociais como vício em jogos de azar e inadimplência.

Através da plataforma de inteligência de redes sociais da Palver, é possível analisar uma amostra de mais de 80 mil grupos de WhatsApp. Quando pesquisamos dicas de “renda extra”, “bets” e “cassinos online” em grupos de WhatsApp, as mensagens alcançaram mais de 1 milhão de usuários nos últimos três meses e possuem um volume de menções médio superior ao de figuras públicas notórias como o presidente Lula e o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Foi possível identificar diversas modalidades de fraudes divulgadas em grupos de WhatsApp, como cassinos online, revenda de serviços piratas, golpes do Pix, plataformas de investimentos falsos, venda de cursos e a indústria de cortes.

O incentivo a cassinos online consiste em mensagens que recomendam diversos jogos no estilo caça-níquel, um deles é o famoso “Jogo do Tigrinho”. Exemplos são “Fortune Tiger”, “Dragon Luck”, “Fortune Rabbit”, “Circus” e muitos outros.

Mensagens com a chamada “Horários Pagantes” recomendam jogar em horários específicos como entre 17h01 e 17h05, para garantir pagamentos maiores. Vídeos do YouTube também são compartilhados e aparecem aos montes em canais com por volta de 1 milhão de inscritos.

Alguns vídeos informam que existem “bugs” ou erros nas plataformas que garantem vitória, e que devem ser aproveitados o quanto antes porque serão corrigidos, criando a sensação de urgência para apostar.

A indústria de cortes também promete riquezas através de cursos para fazer cortes de vídeos de influenciadores.

Um exemplo de mensagem disparada por robôs tem a chamada “Prospere com Cortes do Marçal”. A mensagem disponibiliza um link onde o usuário pode comprar por R$ 12 acesso a um ambiente de cortes que promete gerar pelo menos R$ 10 mil reais de renda mensal com cortes de Pablo Marçal.

Links com instruções para vender plataformas de cursos direcionam a um site chamado Black Bot que afirma oferecer uma “Máquina de Comissões”. O site mostra vídeos de participantes que dão depoimentos mostrando que ganharam os seus primeiros R$ 10 mil reais em apenas um mês utilizando a plataforma

A análise destes sistemas de divulgação raspa apenas a superfície do que foi encontrado. Fica evidente que existe uma grande indústria de propaganda que busca enganar usuários na internet.

Preocupa ver que parte significativa da renda nacional está sendo direcionada para este tipo de serviço que, em última instância, é improdutivo para o país e gera apenas consequências negativas não apenas para as vítimas, mas para toda a sociedade.